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24 novembro 2020

Rio: Favela, violência e pobreza

 


O Rio de Janeiro é hoje um grande emaranhado de problemas nas mais diversas dimensões. Em relação ao Brasil é também um caso recheado de particularidades, por exemplo:Como explicar para alguém no interior de Mato Grosso o racional que leva alguém a escolhe morar em uma favela? Numa cidade como Rondonópolis, com 100k de reais compra-se uma boa casa num bairro comum ou classe C, no Rio de Janeiro isso é uma casa em São Gonçalo ou na favela (dependendo da favela esse valor talvez já esteja até datado).


Quando você coloca na conta, os fatores que vêm junto com São Gonçalo, a favela parece uma opção cada vez melhor. Sendo um pouco mais especifico, o município do região metropolitana sofre com um ciclo em que pobreza gera pobreza, as classes mais abastadas da região (e aqui inclui-se o município vizinhos de Itaboraí [ que por um tempo pareceu que ia criar identidade, mas essa esperança morreu junto com o comperj]) invariavelmente acabam se transferindo completamente, ou no mínimo direcionam o consumo para Niterói. Ponto interessante é que essas classes mais abastada nem são necessariamente São Francisco/Icaraí, por vezes acaba sendo Fonseca e a região de Pendotiba.  E isso muito por conta de questões básicas de infraestrutura do município e qualidade de vida de modo geral.  


São Gonçalo ainda tem uma cesta de problemas que passa por um transporte público e um déficit de identidade. No âmbito do transporte, basta lembrar que a única parte do sistema que funciona bem é aquela que serve justamente para sair de São Gonçalo. No âmbito de identidade, quando você observa o que aconteceu com os subúrbios do Rio não é difícil perceber que em algum grau os bairros ao longo da Avenida Brasil têm uma identidade, nem precisa ser muito, só o suficiente para criar um pertencimento. Em São Gonçalo isso inexiste.


Ponto é que essa lista vai longe, e pode ser resumida na perspectiva de que a única coisa que funciona em São Gonçalo é a saída, dá pra pensar ainda que tudo acontece no Rio e algumas coisas acontecem em Niterói, o que leva São Gonçalo a ser um grande vazio econômico.


Voltando ao ponto inicial de porque as pessoas escolhem a favela, é uma questão de que tentar encontrar uma casa na banda dos 100k no Fonseca , pode ser uma tarefa árdua. E provavelmente o agente ainda vai ter de lidar com estresse de trânsito e mobilidade sem contar o custo da mobilidade – Alguns conseguem lidar com isso através de vale-transporte, mas como tudo acontece no Rio, esse “tudo” incluí até o que vale-transporte não cobre, tipo cultura. Esse acaba sendo um ponto para a favela, por vezes bem localizada. Tem o Barreto, mas é um limbo de Niterói com jeito de São Gonçalo e preços de Niterói. Um elemento adicional na análise é que elevando nosso orçamento para uns 200k a cena não é tão diferente.


Quando você vai colocando todos esses elementos na conta; a favela, vai ficando cada vez mais interessante. Mas é difícil explicar isso para um Brasil que vê o Rio pela TV.


No âmbito da violência; diferente de São Paulo,  eu particularmente sempre tive a impressão de que a coisa é bem mais simples do que querem fazer parecer – admito que há boas chances de eu estar errando até porque existe um transição em curso para o modelo da milícia. Mas quando você fala da violência em especial a que se faz mais notar noticiário e impacta o turismo no Rio –mais especificamente a violência da troca de tiros entre facções e a própria disputa entre esses agentes – ela não é nem de longe tão estruturada quanto o que se formou em São Paulo ao redor da facção principal.  Essa dualidade entre os modelos é central na percepção da violência nos dois Estados.


 Em São Paulo a estrutura é sofisticada e possivelmente deve incluir, direta ou indiretamente, muita gente com passagem pelas estruturas acadêmicas de elite paulista, até porque não é qualquer um que vai conseguir gerenciar o que você encontra no mondus operandi centralizador visto na facção paulista. 


No Rio as estruturas criminosas são tão fragmentadas, e desorganizadas quando comparado a São Paulo que no fim é muito mais uma disputa de macho-alfa do que de fato uma estrutura que busca ser rentável. Não é que não dê dinheiro, mas na prática quando você começa a olhar para o que está na cabeça das bases das facções cariocas (isso olhando pra comentários sobre disputas de facções em vídeos do youtube ou blogs que dificilmente ficam no ar por muito tempo) é uma disputa de times , que se as pessoas envolvidas tivessem um pouquinho mais de condição financeira dificilmente ia além do Counter-Strike.


Mas essas bases não têm estrutura financeira, estrutura familiar e muitas vezes nem um teto digno. Aqui já da para passar por um ponto que a Favela no Rio está longe de ser uma estrutura uniforme você tem comunidades que estão no limite da miserabilidade (Porto Velho, São Gonçalo tem um bom exemplo disso) e tem também quem só queira morar perto do trabalho (favelas próximas de áreas nobres cariocas).


Na perspectiva da disputa de macho-alfa, o tráfico em si não gera a disputa, mas ele financia e da forma a essa disputa. Quando você soma as peças, em especial nesse de caso porto Velho, você chega em um quadro que se retroalimenta. 


O cara é pobre tá rodeado de pobreza, e olha pro quão na frente o cara que tá envolvido no tráfico salta na frente dele no “Marriage Market”(e esse termo, que de fato existe serve pra pular uma longa discussão), é apenas uma questão de  seguir um racional básico pra entender como o cara chega no tráfico.


As bases da criminalidade no Rio, são tão confusas, que é provável que essa combinação de disputa de torcidas (que inclui certo acolhimento pela facção), pobreza, hormônios e Marriage Market...em suma a disputa do macho alfa, tenha peso bem maior do que a rentabilidade disso tudo.


A única solução sistêmica razoável, seria escolher os vencedores e racionalizar a disputa em rentabilidade. De preferência vencedores que você possa controlar através de alguma estrutura de inteligência.


E nisso a minha perspectiva é que quando você passa a ter uma estrutura mais sofisticada, como você já vê em São Paulo, você chega a gerar externalidades positivas: uma estrutura que percebe que chamar atenção das autoridades com disputas e tiroteios dá prejuízo, então passa a optar pela descrição; uma estrutura que pra lavar dinheiro cria empreendimentos que geram empregos.


Enfim, dá para ser bem mais puritano nisso tudo? Acho difícil, o tráfico é o maior exemplo no mundo, de como o livre mercado não pode ser derrotado através da burocracia estatal, aka canetada.